sexta-feira, 23 de junho de 2023

FERNANDO

 Faculdade é um caldeirão, dentro do qual a gente circula seguindo o fluxo, fala com todo mundo, mas cedo ou tarde chega a conclusão que  as afinidades são poucas. Mas sempre  tem aquele, que como você, é um ponto fora da curva, aquele esquisitão, que você acha engraçado, ri das piadas ácidas que são uma forma de lidar com as agruras do mundo dentro e fora da gente. Se identifica com sua origem simples, tenta alertar que não adianta ele tentar ser playboy igual aos outros, porque ele essencialmente  não é.  As  preocupações reais são a sua família que ficou no interior,  o esforço para organizar seu mundo íntimo, lidar com a angústia do desejo de conciliar a profissão que ele escolheu com um estilo de vida tranquilo. Respirar fundo, arregaçar as mangas, ser competitivo. Nadar contra a maré.

Aquele que ri das próprias piadas, às vezes sem graça, mas seu riso quase infantil, o brilho matreiro dos seus olhos esverdeados faz a gente rir também.

Aquele cara meio sem noção, folgado,  que liga no telefone fixo pra nada,  bate um papo com seu pai, depois não se lembra  para que ligou. Procastinação compartilhada! 

O que sumia da aula, das festas, evaporava sem  se despedir, porque estava com sono ou de saco cheio.

E foi assim que ele deixou essa vida! Num átimo! Sem sequer acenar.

Sem permitir que a vida se redimisse por traçar destinos distantes  e concedesse um encontro, ainda que casual.

Sem nos dar a chance de olhar ainda uma vez os seus olhos matreiros e contar uma piada sem graça pra ver abrir seu sorriso branco. 

Talvez sem saber que foi ingrediente essencial para minha sobrevivência  naquele caldeirão!

terça-feira, 2 de maio de 2023

Titãs

 Todo show tem uma história. 

Essa foi longa, com final quase feliz! 

Vamos a ela:

Em janeiro tive a notícia desse Encontro, que reuniria os Titãs novamente, após 25 anos.

Comprei ingressos para toda a família na pista mais distante do palco. 

Em março chega um convite de casamento. Um primo que anda muito sumido, mas com o qual tenho uma história. Sou madrinha dele, fomos muito próximos quando ele era criança.

O casamento é no mesmo dia do show. O drama começa.  

Elaboramos estratégias malucas, nenhuma plausível de conciliar os dois eventos.

Mas as ideias estão no chão, você tropeça e acha a solução. Abre novo show para domingo. Fica decidido: Eu vou ao casamento no sábado com o pequeno, o restante da família vai ao show. 

Eu vou ao show no domingo e o marido faz o sacrifício de me acompanhar e assistir novamente.

Detalhe: para o domingo a pista melhor estava com um bom preço. Compramos para ela.

Chega o grande dia e tudo parece estar dando certo. Mas... O show foi horrível. Produção desonesta. O horário do ingresso não correspondia ao início efetivo do show, mas à abertura dos portões. Os Titãs começam a tocar após 2 horas. As crianças já cansadas. A acústica na pista posterior  é horrível. Meus filhos saem do show sem a oportunidade de conhecer realmente os Titãs. Frustração total.

Mas no domingo, já sabendo da desorganização da produção, chegamos mais tarde ao local. A pista da frente é bem melhor. Acústica decente, conseguimos ver o palco.

A desonestidade é vender ingresso para um arremedo de pista, da qual não se vê nem ouve nada.

Mas na pista certa, naquela que é  honesta, tivemos um show sensacional!

Sensacional!

Branco Melo nos conta da superação do câncer de laringe. Está lá, vivo, cantando,  nos emocionando!

Paulo Mikos, a alma da banda,  nos encanta com seus dotes de ator! 

O pulso potente do Arnaldo Antunes faz pulsar forte nosso coração. Distrubui suas porradas quase no final! Empolga!

Nando Reis, com sua verve do revolucionário elegante.

Marcelo Fromer, presente na presença da sua filha, Alice Fromer.

A guitarra afetiva do Tony Bellotto, o primata Sérgio Brito, o incrível Charles Gavin!

Parece que o tempo não passou para esses caras! Nem pra gente!

Titãs sempre foi a essência da resistência no Rock brasileiro! Espero que meus filhos ainda tenham a oportunidade de sentir de perto!


Marvin, a vida é pra valer!



segunda-feira, 17 de abril de 2023

OS MINI CARAS

 Ontem rolou um amistoso entre escolas.

Cheguei adiantada achando que estava atrasada. O time da escola anfitriã estava descontraído na quadra. Abri os braços e perguntei: 
- E o amistoso? Foi cancelado?
- Não, mãe! Já vai começar! Olha os "caras" chegando!
Olhei os caras. Eram "mini caras"! Meninos muito pequenos! Claramente menores em tamanho e provavelmente em idade se comparados aos anfitriões.  
Pensei: "que desorganização dessa escola de esportes! Os times estão em evidente desigualdade de condições! Vai ser uma lavada!"
Começou o jogo. Começou a lavada! Os mini caras meteram um, dois, três, só de entrada! Eles tinham um mini Messi, cabelos longos atrás da bandana. Meteu três! Eles tinham um mini Cris! Meteu vários! Depois corria e dava o pulinho com os bracinhos esticados para trás.  
E os mini caras deram um passeio nos João Grandões! Os anfitriões se viraram na raça para evitar a humilhação. Conseguiram diminuir. Terminou 10 a 7 para os pequenos visitantes!
Todos os pais ficaram de boca aberta. Os pais dos minis tinham um sorrisão na boca aberta! Os pais dos grandes tinham só a boca aberta mesmo! 
A moral desta história está clara! Nunca julgue um time pelo tamanho, muito menos pela idade. Nunca julgue nenhum ser humano pela aparência. A enormidade do que está dentro de nós e a imensidão da nossa força não se encontram visíveis aos olhos físicos!

quinta-feira, 25 de novembro de 2021

O Presente

 

Esse mês foi meu aniversário casamento. Em uma semana tão tumultuada de trabalho e obrigações diversas, nós conseguimos apenas comer um japonês em casa mesmo, na companhia das crianças, frutos deliciosos desses 14 anos de casados. Na sexta feira dessa mesma semana, com tranqüilidade, programei um jantar mais elaborado, pensei na harmonização com o vinho...  e sem querer consegui o presente de aniversário mais inusitado e sensacional de todos!

Mas para contar que presente foi esse, vou precisar contar uma história. Uma história que se passou há 15 anos atrás.

Eu estava no último ano da minha residência médica, trabalhando mais que vivendo. Férias chegando, planejamos mais uma das nossas viagens pouco convencionais. O plano dessa vez era uma descida de carro pela Serra do Mar, iniciando em Paraty. Era uma viagem com algumas particularidades. Férias muito esperadas e merecidas, nós dois muito cansados, em fim de residência, dinheiro curto. Seria nossa última viagem antes de nos casarmos. A programação  era pegar o carro e ir sem programação alguma, ficar em cada local o tempo que desse na telha. Fomos. Com um Guia 4 Rodas na mão,  a bordo de um Palio 1000 partimos para Paraty. Baixa temporada, foi fácil conseguir um pouso digno a baixo custo. Curtimos uns dias na cidade, mas o tempo foi fechando. Seguindo nosso plano de descer a Serra, rumamos para Trindade. Uma pousadinha à beira mar. De onde não conseguimos ver o mar. O tempo fechou com tanta fúria, que as chuvas torrenciais nos impediam de permanecer na varanda a beira mar. Tivemos que inventar o plano B. Não estava difícil. Não havia reservas em hotéis. Podíamos alterar a rota sem nenhum trabalho ou prejuízo. O Guia 4 Rodas, alguma criatividade e aquela animação insana dos jovens decidiram nosso novo destino. Monte Verde. Sem GPS, com o mapa rodoviário aberto, lá fomos. A viagem de carro até Monte Verde foi um dos pontos altos da viagem. Evitando a rodovia principal, fomos pelo interior. As paisagens que se descortinavam atrás de cada curva das estradinhas eram de tirar o fôlego. No início da noite chegamos em Monte Verde por uma estrada local, de terra,  sem iluminação, embaixo de uma chuvinha fina e constante, guiados por uma plaquinha pintada a mão com uma setinha indicando o rumo.

Nosso próximo passo em Monte Verde foi achar pouso. O Guia 4 rodas, consultado para uma pousada com preço pagável, foi nos guiando para longe demais. Após subir muito morro, à noite com chuva, enxergamos uma pessoa descendo o morro. Era uma mulher. Paramos para tentar alguma informação sobre a existência da pousada que procurávamos. A moça, muito educada, informou que estávamos no caminho certo, mas precisaríamos subir mais um pouco. Continuamos subindo e ela descendo. Mas o destino não chegava nunca e decidimos descer novamente o morro e tentar um pouso mais próximo da civilização. No meio da descida, a mesma moça nos faz um sinal. Paramos. Perguntou se não tinha dado certo na pousada. Respondemos que iríamos tentar algo mais perto. Nesse momento, o tempo até então fechado se abriu de forma extraordinária. Essa pessoa, da qual até hoje eu consigo me lembrar da silhueta e do tom de voz, era a gerente do melhor hotel da cidade, e nos ofereceu pouso a um custo muito acessível, já que era baixa temporada e a cidade, assim como o hotel  estavam vazios. Com essa bonança inesperada após a inesperada tempestade curtimos a cidade como se não houvesse amanhã. Mas havia. Ia se aproximando o dia de voltar para casa! Começamos então a ter idéias... voltar à Trindade? Impossível. A chuva continuava firme lá. Então quem sabe um local agradável no Sul de Minas mesmo, que de quebra a gente ainda quebrava a viagem de volta!

Partimos com muita alegria e animação para São Lourenço. A cidade não é uma cidade muito bela do ponto vista arquitetônico, principalmente quando a vista estava acostumada à Monte Verde. Locais turísticos também não eram muitos nem muito atrativos. Mas quem tem um Guia 4 Rodas novinho nunca está só. Descobrimos um hotel fazenda em Baependi, daqueles no meio do nada. Iniciamos a subida de mais um morro, mas dessa vez em um lindo dia de sol, e não desistimos. Dessa vez subimos até a chegada ao esperado destino. Encontramos os portões fechados. Fizemos o óbvio. Tocamos o sino. Abriram-se os portões do paraíso. Um hotel fazenda muito maravilhoso, que à época ainda estava em processo de acabamento. Dessa forma, o preço nos favoreceu mais uma vez.

No restaurante, rapidamente travamos conhecimento com o garçom, um rapazinho em treinamento, muito simpático, que nos apresentou ao Chef, que havia trabalhado na França e após se aposentar retornou à sua terra natal. A partir daí passamos a escolher o cardápio diariamente. O Chef  nos perguntou se gostávamos de molho pesto. Nós não conhecíamos, nunca havíamos experimentado. Então o jantar se tornou promissor. A noite nos dirigimos muitíssimo



animados para o restaurante, nos sentindo celebridades hollywoodianas. O nosso amigo, o garçom veio nos servir o vinho. Na hora de abrir a rolha quebrou. Ele, meio sem saber o que fazer, nos pediu um momento e levou o vinho para dentro. Retornou rápido, com uma rolha intacta, nos serviu o vinho, que estava uma delícia. Mas reparando um pouco na garrafa, percebemos que a rolha estava lá dentro! Rimos muito da situação, degustamos com muita alegria o nosso macarrão ao molho pesto, agradecemos pelo jantar maravilhoso, e nunca esquecemos essa noite inusitada!

Bem, mas vamos ao presente de aniversário de casamento! Então, estava eu finalizando o jantar e resolvi abrir o vinho para deixar decantar. Não sei foi o abridor, ou minhas articulações de manteiga, ou a rolha ressecada, mas a rolha quebrou. Tentei de toda forma tirar a outra metade, mas ela acabou caindo dentro do vinho. Naquele momento entrei no túnel do tempo, e relembrei essa viagem épica, uma das nossas melhores!

Na hora do jantar anunciei que tinha um presente sensacional para ele. Segurando a garrafa de vinho relembrei nossas aventuras ocorridas há 15 anos. Quando terminei, o mais velho se antecipou (sim, as crianças sempre participam dos jantares românticos, e adoram!) – “A rolha está aí dentro?” Mostrei a garrafa! “Sim, o presente é uma viagem no tempo!”

Eu já falei que foi o presente mais sensacional de todos? Porque foi!

sexta-feira, 3 de setembro de 2021

Giovanas

 Quando eu era criança, era encantada com a ideia do ano 2000. Pensava, com as contas feitas: "No ano 2000 vou ter 25 anos!" Pensava isso como sendo um futuro longínquo, muito distante! 

Agora já se passaram 20 anos desde que aquela menininha completou 25 anos! Hoje, completando 45 anos, a menina está aqui. Bem aqui dentro, revivendo a intensidade que foram esses 20 anos! A moça de 25, por assim dizer, foi morrendo aos poucos, para que a menina pudesse reviver! 

Nesses intensos 20 anos as transformações foram profundas! 

A vaidade conferida pelo título de "Dra" foi substituída pela responsabilidade do cuidado com a vida dos filhos das outras pessoas, e pelo entendimento de que todos os profissionais que lutam diariamente pela vida têm a mesma importância, o mesmo valor!

O casamento ensinou que o "felizes para sempre" existe, mas demanda investimento no outro, respeito e tolerância, além do amor!

A maternidade! Nenhuma tarefa se compara à de cuidar e educar outros seres humanos. A gente se desnuda para o mundo, e o mundo se abre de uma forma incrível aos nossos olhos, que passam a enxergar as coisas com a precisão que só o coração materno adquire!

Nesses 20 anos foram travadas tênues e agradáveis batalhas de auto-conhecimento. O "escrever" e o "cozinhar" me reinventaram e deram nova dimensão à minha vida.

Se eu puder fazer a mim mesma um desejo de aniversário, seria que os próximos 20 anos sejam tao intensos quando esses que se passaram!


Essa sou eu!

Sem maquiagem, sem botox,  sem tinta no cabelo, sem dietas! Eu gosto mim assim!

As linhas na face são minha história!  A ruga da braveza entre os olhos é a minha favorita. Faz parte da minha luta, pessoal e coletiva!

Os fios de cabelo branco me lembram que minhas conquistas são mais numerosas que eles! E os quilos... esses danados! Foram se acomodando sorrateiramente após cada gestação! 

Essa sou eu. Moldada pela vida. 

Quero continuar assim. Não tenho tempo para clínicas de estética,  lojas de grife nem dietas! 

Hoje faço 44 anos. Tenho uma vida para viver!


Hoje faço 40 anos.

 Fiquei pensando se a mudança do primeiro dígito seria efetivamente o início de um novo ciclo ou simplesmente o número seguinte.

Fazendo uma comparação superficial com meus 20 anos, sinceramente acho que a mudança foi pequena. Não me enxergo tão mais madura, nem tão mais sábia, aliás, a maternidade mostrou que sabedoria é uma virtude de difícil aquisição. Também, estranhamente, não me sinto mais velha. Mantenho o mesmo fascínio pelo novo, pelo desafio, a mesma disposição para a luta, o mesma busca incansável pela felicidade. O mesmo riso fácil.

Difícil acreditar em ciclos. Penso que a vida é o grande ciclo, espiral  que tentamos galgar, lenta e progressivamente!


segunda-feira, 26 de julho de 2021

Lavínias

 Minha menininha vai crescendo em graça e beleza!

 Atitude e Generosidade se firmam como características marcantes de uma personalidade forte!

A moça já disputa espaço com a menina, mas a infância ainda se faz plena!

Minha menina de 8 anos!

Lalá faz 8 na Serra!

7 ANOS!

Essa idade é aquela que dá o primeiro aperto no coração! 

As palavras erradas são substituídas pelas gírias! Os desenhos pelos you tubers!

A janelinha confere os últimos ares da primeira infância. Mas a gente sabe que logo irão nascer dois dentes enormes e serrilhados, e o rostinho de criança vai se transformando no de uma linda moça!

Minha moça de 7 anos!

Que conserve a gargalhada barulhenta e a imensa alegria de viver!

Parabéns minha Lavínia!




Há 3 anos você chegou como um tsunami!

Virou nossas vidas de ponta cabeça, abalou as mais sólidas convicções , nos removeu da zona de conforto e dilatou as fronteiras dos nossos limites. 

Nos reinventou.

Tsunami de amor...

Mar de doçura com ondas intensas!

Minha doce Lavínia



Princesa, Guerreira...

Há dois anos "a sua presença entra pelos sete buracos da minha cabeça"... Impetuosamente!

Intensamente

Inebriante

Lavínia!

sexta-feira, 20 de novembro de 2020

CÉSAR

 CÉSAR

Durante toda a gestação do meu primeiro filho, entre as poucas convicções que eu tinha, estava a escolha de qual dos meus sobrenomes seria o dele. Mediante o acordo prévio de um nome curto, escolheríamos, eu e meu marido, apenas um dos nossos sobrenomes para dar aos filhos. Por algum tempo acreditei que minha escolha estava feita. Seria, claro, o sobrenome da minha mãe, como uma forma de quebrar paradigmas do patriarcado. Mas a razão, essa nobre guerreira que vive dentro de mim, vive perdendo batalhas para o persuasivo coração. Quando nasceu um menino, o primeiro neto do meu pai, o coração venceu mais uma. Não pude furtar ao meu pai a alegria de colocar seu nome de família no seu primeiro neto. César. Meu filho se chamou Bernardo César Santos. E assim por diante, foram todos os netos ganhando o sobrenome do avô, os meus filhos e os filhos da minha irmã. O que eu ainda não sabia, é que o coração havia acertado em cheio. Apenas durante a minha terceira gestação, pude ter a alegria de saber que o meu objetivo inicial havia sido alcançado com maestria! 


Bernardo, que nessa época tinha sete anos, andava muito curioso sobre seus bisavós e tataravós, perguntou ao meu pai como se chamavam seus avós. Meu pai então nos contou uma história inédita para mim.

O avó dele, meu bisavó, se chamava Martinho. Tinha um sobrenome pomposo de uma família rica da região. Mas esse sobrenome não o fazia feliz. Ele era filho de um homem que pertencia a essa família rica e importante. Mas esse homem não era o marido de sua mãe. Sua mãe, solteira, negra, era  empregada da família. Embora tenha ganhado o sobrenome, meu bisavô, Martinho, não havia ganhado o reconhecimento da família, e não se sentia parte dela. Casou-se com minha bisavó. Francisca Augusta César, descendente direta da recente escravidão. Então nasce meu avô. Primeiro filho do casal. Meu bisavô se furta a meter-lhe o sobrenome da família pela qual não tinha estima. Como seu registro pessoal para o primeiro filho, deu-lhe Martinho como segundo nome. O primeiro nome? Francisco. O sobrenome: César. Primeiro nome e sobrenome advindos de sua mãe. O filho de Francisca Augusta César e Martinho se chamou Francisco Martinho César.

Conheci apenas essa pequena parte da história da minha bisavó, Francisca. Mas sua força se fez sentir. No início do século passado, em 1905 para ser mais exata, uma mulher negra dá seu nome e sobrenome ao primeiro filho homem, como forma de suplantar o desprezo  social através do amor.

A mãe de Martinho, mulher preta de coragem, que conseguiu dar ao filho o reconhecimento paterno, ainda que formal, garantindo-lhe o conhecimento da sua origem e a opção em relegá-la, ganhou a merecida homenagem. A segunda filha de Martinho e Francisca se chamou Maria. Ganhou o nome a avó paterna, seguindo o caminho de lutas, com a força que vem intrínseca no nome. Maria!

E eis que o sobrenome escolhido para meus filhos vem representar o verdadeiro rompimento, não apenas  com o patriarcado, mas com convenções sociais cruéis e excludentes.  Meus filhos e sobrinhos carregam um sobrenome que representa a essência da resistência. A resistência anônima do cotidiano.

César. Pequeno e forte como foi a família de Francisca e Martinho.